A boa nova da família
§114. Proclamamos com alegria o valor
da família na América Latina e no Caribe. O Papa Bento XVI afirma que a
família, “patrimônio da humanidade, constitui um dos tesouros mais importantes
dos povos latino-americanos e caribenhos. Ela tem sido e é escola da fé,
palestra de valores humanos e cívicos, lar em que a vida humana nasce e se
acolhe generosa e responsavelmente...
- A família é insubstituível para
a serenidade pessoal e para a educação de seus filhos”.
§115. Agradecemos a Cristo que nos
revela que “Deus é amor e vive em si mesmo um mistério pessoal de amor” e,
optando por viver em família em meio a nós, a eleva à dignidade de ‘Igreja Doméstica’.
§116. Bendizemos a Deus por haver
criado o ser humano, homem e mulher, ainda que hoje se queira confundir esta
verdade:
“Criou Deus os seres humanos à
sua imagem; à imagem de Deus os criou, homem e mulher os criou” (Gn 1,27).
Pertence à natureza humana que o homem e a mulher busquem um no outro sua
reciprocidade e complementaridade.
§117. O fato de sermos amados por Deus
enche-nos de alegria.
- O amor humano encontra sua
plenitude quando participa do amor divino, do amor de Jesus que se entrega
solidariamente por nós em seu amor pleno até o fim (cf. Jo 13,1; 15,9).
- O amor conjugal é a doação
recíproca entre um homem e uma mulher, os esposos: é fiel e exclusivo até à
morte e fecundo, aberto à vida e à educação dos filhos, assemelhando-se ao amor
fecundo da Santíssima Trindade.
- O amor conjugal é assumido no
Sacramento do Matrimônio para significar a união de Cristo com sua Igreja. Por
isso, na graça de Jesus Cristo encontra sua purificação, alimento e plenitude
(Ef 5,23-33).
§118. No seio de uma família, a pessoa
descobre os motivos e o caminho para pertencer à família de Deus. Dela
recebemos a vida que é a primeira experiência do amor e da fé. O grande tesouro
da educação dos filhos na fé consiste na experiência de uma vida familiar que
recebe a fé, a conserva, a celebra, a transmite e dá testemunho dela. Os pais
devem tomar nova consciência de sua alegre e irrenunciável responsabilidade na
formação integral dos filhos.
§119. Deus ama nossas famílias, apesar
de tantas feridas e divisões. - A presença invocada de Cristo através da oração
em família nos ajuda a superar os problemas, a curar as feridas e abre caminhos
de esperança.
- Muitos vazios de lar podem ser
atenuados através de serviços prestados pela comunidade eclesial, família de
famílias.
A boa nova da atividade humana
O trabalho
§120. Louvamos a Deus porque na beleza
da criação, que é obra de suas mãos, resplandece o sentido do trabalho como participação
na sua tarefa criadora e como serviço aos irmãos e irmãs. Jesus, o carpinteiro
(cf. Mc 6,3), dignificou o trabalho e o trabalhador e recorda que o trabalho
não é mero apêndice da vida, mas que “constitui uma dimensão fundamental da
existência do homem na terra”, pela qual o homem e a mulher se realizam como
seres humanos. O trabalho garante a dignidade e a liberdade do homem, e é
provavelmente “a chave essencial de toda ‘a questão social’”.
§121. Damos graças a Deus porque sua
palavra nos ensina que, apesar do cansaço que muitas vezes acompanha o
trabalho, o cristão sabe que este, unido à oração, serve não só para o
progresso terreno, mas também para a santificação pessoal e a construção do
Reino de Deus. O desemprego, a injusta remuneração pelo trabalho e o viver sem
querer trabalhar são contrários ao desígnio de Deus. O discípulo e o
missionário, respondendo a esse desígnio, promovem a dignidade do trabalhador e
do trabalho, o justo reconhecimento de seus direitos e de seus deveres, desenvolvem
a cultura do trabalho e denunciam toda injustiça.
- A salvaguarda do domingo, como
dia de descanso, de família e de culto ao Senhor, garante o equilíbrio entre
trabalho e repouso.
- Cabe à comunidade criar
estruturas que ofereçam trabalho às pessoas deficientes, segundo suas
possibilidades.
§122. Louvamos a Deus pelos talentos,
estudo e decisão de homens e mulheres para promover iniciativas e projetos
geradores de trabalho e produção, que elevam a condição humana e o bem-estar da
sociedade. A atividade empresarial é boa e necessária quando respeita a
dignidade do trabalhador, o cuidado do meio-ambiente e se orienta para o bem
comum.
- Perverte-se quando, buscando só
o lucro, atenta contra os direitos dos trabalhadores e a justiça.
A ciência e a tecnologia
§123. Louvamos a Deus por aqueles que
cultivam as ciências e a tecnologia, oferecendo imensa quantidade de bens e
valores culturais que têm contribuído, entre outras coisas, para prolongar a
expectativa de vida e sua qualidade. No entanto, a ciência e a tecnologia não
têm as respostas às grandes interrogações da vida humana. A resposta última às
questões fundamentais do homem só pode vir de uma razão e ética integrais,
iluminadas pela revelação de Deus. Quando a verdade, o bem e a beleza se
separam; quando a pessoa humana e
suas exigências fundamentais não constituem o critério ético, a ciência e a
tecnologia voltam-se contra o homem que as criou.
§124. Hoje em dia as fronteiras
traçadas entre as ciências se desvanecem. Com este modo de compreender o
diálogo, sugere-se a ideia de que nenhum conhecimento é completamente autônomo.
Esta situação abre um terreno de oportunidades à teologia para interagir com as
ciências sociais.
A boa nova do destino universal dos bens e
da ecologia
§125. Junto com os povos originários da
América, louvamos ao Senhor que criou o universo como espaço para a vida e a
convivência de todos os seus filhos e filhas e no-los deixou como sinal de sua
bondade e de sua beleza. A criação também é manifestação do amor providente de
Deus; foi-nos entregue para que cuidemos dela e a transformemos em fonte de
vida digna para todos. Ainda que hoje se tenha generalizado maior valorização
da natureza, percebemos claramente de quantas maneiras o homem ameaça e
inclusive destrói seu ‘hábitat’. “Nossa irmã a mãe terra” é nossa casa comum e
o lugar da aliança de Deus com os seres humanos e com toda a criação.
Desatender as mútuas relações e o equilíbrio que o próprio Deus estabeleceu
entre as realidades criadas, é uma ofensa ao Criador, um atentado contra a
biodiversidade e, definitivamente, contra a vida. O discípulo missionário, a
quem Deus confiou a criação, deve contemplá-la, cuidar dela e utilizá-la,
respeitando sempre a ordem dada pelo Criador.
§126. A melhor forma de respeitar a
natureza é promover uma ecologia humana aberta à transcendência que,
respeitando a pessoa e a família, os ambientes e as cidades, segue a indicação paulina
de recapitular as coisas em Cristo e de louvar com Ele ao Pai (cf. 1 Cor
3,21-23). O Senhor entregou o mundo para todos, para os das gerações presentes
e futuras. O destino universal dos bens exige a solidariedade com as gerações
presentes e as futuras.
- Visto que os recursos são cada
vez mais limitados, seu uso deve estar regulado segundo um princípio de justiça
distributiva, respeitando o desenvolvimento sustentável.
O Continente da esperança e do amor
§127. Como discípulos e missionários
agradecemos a Deus porque a maioria dos latino-americanos e caribenhos estão
batizados.
- A providência de Deus nos
confiou o precioso patrimônio de pertencer à Igreja pelo dom do batismo que nos
tem feito membros do Corpo de Cristo, povo de Deus peregrino em terras americanas
há mais de quinhentos anos.
- Alenta nossa esperança a
multidão de nossas crianças, os ideais de nossos jovens e o heroísmo de muitas
de nossas famílias que, apesar das crescentes
dificuldades, seguem sendo fiéis
ao amor. Agradecemos a Deus a religiosidade de nossos povos que resplandece na
devoção ao Cristo sofredor e à sua Mãe bendita, na veneração aos Santos com suas
festas patronais, no amor ao Papa e aos demais pastores, no amor à Igreja
universal como grande família de Deus que nunca pode nem deve deixar seus
próprios filhos a sós ou na miséria.
§128. Reconhecemos o dom da vitalidade
da Igreja que peregrina na América Latina e no Caribe, sua opção pelos pobres, suas
paróquias, suas comunidades, suas associações, seus movimentos eclesiais, novas
comunidades e seus múltiplos serviços sociais e educativos. Louvamos ao Senhor
por ter feito deste continente um espaço de comunhão e comunicação de povos e culturas
indígenas. Também agradecemos o protagonismo que vão adquirindo setores que
foram deslocados: mulheres, indígenas, afro-americanos, homens do campo e
habitantes de áreas marginais das grandes cidades. Toda a vida de nossos povos
fundada em Cristo e redimida por Ele, pode olhar para o futuro com esperança e
alegria, acolhendo o chamado do Papa Bento XVI:
“Só da Eucaristia
brotará a civilização do amor que transformará a América latina e o Caribe para
que, além de ser o Continente da esperança, seja também o Continente do amor!”
Documento de Aparecida-2007
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